quarta-feira, 23 de julho de 2008

III EXPEDIÇÃO CAMINHOS DOS GERAES - Guimarães Rosa realmente foi um visionário

Hoje começamos a articular mais um projeto para a ONG: trazer a Expedição Caminhos dos Geraes para ser adaptada para Sergipe.


No ano passado, em novembro, participei de uma experiência incrível, a III Expedição Caminhos dos Geraes, realizada pela Prefeitura de Montes Claros (MG), em parceria com o Instituto Estadual de Florestas - IEF e vários patrocinadores (nossa parece que foi ontem!). Esta atividade tem por objetivo mobilizar participantes de vários setores da sociedade (gestores públicos, empresas privadas e sociedade civil organizada) para sensibilização quanto aos problemas socioambientais e de implementação do turismo sustentável no Norte de Minas Gerais.


Da esquerda para a direita: equipe Grande Hotel; banho na cachoeira da Serra Nova, orientações sobre as unidades de conservação.

O tema foi os 150 anos do Município de Montes Claros. A Expedição partiu de Montes Claros no dia 15 de novembro de 2007, composta por 4 roteiros: Sertão Montes Claros, Veredas, Trem Baiano e Unidades de Conservação. Eu e minha grande amiga Vanessa participamos da equipe do roteiro de Unidades de Conservação, formado por 23 pessoas. Cada carro saía com uma matula com paçoca de carne, rapadura e pinga representado os expedicionário desbravadores do Sertão Mineiro. Foram mais de 960 km percorridos e 9 municípios visitados. Em Monte Azul, aconteceu o encontro dos roteiros Trem Baiano e Unidades de Conservação.

Visitamos cinco unidades de conservação com acompanhamento do IEF: Parque Estadual da Lapa Grande, Parque Estadual Grão Mogol, Parque Estadual Serra Nova, Parque Estadual Caminho dos Gerais e a Área de Preservação Ambiental da Serra do Talhado.

Eu, Vanessa, Robson, Andreia e Anildes nos conhecemos no Curso de Capacitação em Fundos Socioambientais Públicos em 2005. Vanessa, mesmo com a distância Aracaju-Montes Claros, se tornou uma amiga indispensável na minha vida. Ela me ajudou com esse texto. Robson e Andreia são duas figuras indescritíveis, com um astral inigualável, ambientalistas, inteligentes e cheios de vida. Andreia ficou em Montes Claros na organização e Robson foi no roteiro Trem Baiano


Nossa equipe inicial foi composta por Gilberto (dono de uma madeireira), sua esposa Lolita (dentista) e Ricardo (um jornalista muito especial, inteligente, ético, forte e sensível ao mesmo tempo o Ricardo). Como o nosso carro deu problema mecânico a partir do segundo dia, nos separamos e eu fui acompanhando o pessoal da Rede Globo local (no carro tropa de elite) e Van com o pessoal do IEF (no carro tartaruga). Nosso roteiro não teve problemas de relação interpessoal. Pelo contrário, fomos muito unidos, responsáveis e compromissados com os objetivos da expedição, sem perder o humor. Pessoas com pensamentos, formações e atitudes muito diferentes, mas com um grande respeito ao ponto de vista de cada um e vontade de aprender e crescer com a opinião um do outro. Enfim, muita gente boa reunida. Por isso sempre digo que sou abençoada!

Tinha também o lado lúdico e boêmio da viagem onde colocávamos nomes nos carros (diretoria, abadá, grande hotel, tartaruga, tropa de elite e pulguinha-carrapato-piolho) contávamos piada (Ricardo chegou a conclusão que a bromélia é a calcinha do Cerrado porque ela dá abrigo à perereca), tirávamos onda pelo rádio, banhos de rio e cachoeira regados à pura cachaça mineira (valeu Julius e Gilberto!), além de romances velados (esses eu nem vou falar) e a velha e boa cervejinha à noite.

As Unidades de Conservação – Ucs - são áreas naturais protegidas por lei com objetivo de preservar o ecossistemas e a biodiversidade. Geralmente são locais de grande beleza cênica e detentoras de importantes características naturais e/ou culturais, com limites bem definidos, gestão própria e restrições de manejo. O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC, instituído por lei federal, em 18 de julho de 2000, regula a criação, implantação e gestão das unidades de conservação brasileiras, seja a nível nacional, estadual ou municipal.

Os Parques Estaduais são criados para preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, onde só é permitido o uso indireto de seus recursos naturais como pesquisas científicas, atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e ecoturismo. Todos os Parques Estaduais devem possuir um Plano de Manejo, regularização fundiária e Conselhos Consultivos.

Das UC´s visitadas pela equipe, o Parque Estadual da Lapa Grande é o mais diferenciado em suas características físico-biológicas. Criado em 10 de janeiro de 2004, possui 7.000 hectares, se localizando muito próximo à área urbana de Montes Claros. Situa-se sobre uma importante área cárstica e resguarda um patrimônio espeleológico considerável, um conjunto exuberante de grutas e abrigos. A maioria dessas grutas está localizada dentro dos limites da Fazenda Lapa Grande. Algumas se destacam pelo valor histórico, como a própria Lapa Grande, local de exploração de salitre já nos primórdios da história de Montes Claros. Outras se destacam pelo valor científico: Lapa Pintada, importante sítio arqueológico e a Lapa D’água, com seus espeleotemas raros. Aqui, Vanessa deu uma aula de espeleologia.

O Parque Estadual de Grão Mogol foi criado em 22 de setembro de 1998, com uma área total de 33.324,72 ha totalmente inserida no município de mesmo nome. O parque possui uma composição florística típica e bem preservada. Além do cerrado predominante nas chapadas e dos campos rupestres, encontramos pequenas veredas isoladas, um ambiente incomum na região da Serra Geral. Destacam-se:o cacto discocactus hosrtii, pelo seu endemismo e os campos de sempre vivas pela sua diversidade. Esta unidade de conservação está inserida na bacia hidrográfica do Jequitinhonha e muitos afluentes deste rio possuem nascentes na área do parque, o que aumenta a importância de sua preservação. Grão Mogol qual Grão Mogol!

O terceiro parque estadual visitado foi o da Serra Nova, no município de Rio Pardo de Minas, criado em 21 de outubro de 2003 com 12.658,29 ha. É uma área rica em recursos hídricos, onde se encontram as nascentes do Ribeirão São Gonçalo e dos rios Ventania, Suçuarana, Bomba, Ladim e do Córrego da Velha, dentre outras. Aqui, encontram-se ainda sítios arqueológicos com pinturas rupestres. É o único que não possui problemas com a regularização fundiária, pois toda a sua área é composta por terras devolutas. Aqui, acompanhamos o trabalho dos bombeiros na contenção de incêndios na região. Foi difícil conter a mulherada com tanto bombeiro gato, isso sim!

Criado em 29/03/2007, o Parque Estadual Caminho dos Gerais é a mais nova unidade de conservação da região, com 56.237,37 hectares entre os municípios de Mamonas, Monte Azul, Gameleiras e Espinosa. A proposta de criação desta unidade atendeu a uma demanda da própria população dos municípios, que reivindicou a proteção dos mananciais presentes neste trecho da Serra Geral. A área era pressionada pelo cultivo do eucalipto, pela agropecuária e desmatamento para produção de carvão. Durante os estudos técnicos, o IEF identificou que além da beleza cênica e da presença dos mananciais, a área ainda possuía diversas características de relevância ambiental como a presença de espécies raras, endêmicas ou ameaçadas de extinção. A inspiração para o nome do Parque veio justamente da Expedição Caminhos dos Gerais, que em sua segunda versão (2006), esteve na região e a partir de sua passagem contribuiu para a aceleração do processo de criação da unidade de conservação. No município de Monte Azul existe uma cooperativa que promove cursos de capacitação, possui um centro cultural e comercializa os produtos que produzem. Tivemos um almoço maravilhoso por lá!

A visita a esse Parque mexeu muito comigo. Como a equipe da Rede Globo não havia conseguido as imagens necessárias para a série de reportagens, acordamos as cinco da manhã e fomos ao Parque novamente. Lá conheci melhor duas jornalista incríveis a Laura e a Ana Medeiros. Nossas conversas foram rápidas, mas com lições de vida para todas nós. Inesquecível também foi o nascer do sol e o banho em uma nascente hiper gelada acompanhada do Comandante Jarbas (nosso protetor mor, líder doce e forte, que resolvia todos os problemas) e de Laura. Pensei que ia ter um troço a hora que pulei naquela água gelada. Lá deixei todas as energias negativas que absorvi no ano de 2007 e me senti renovada e purificada. Outra pessoa maravilhosa que encantou a todos na viagem foi o Adailton, gestor desse parque. Foi muito bom saber que outras pessoas ainda acreditam em um mundo melhor, com idelismo, e que podemos contribuir da maneira que nos é possibilitado. O conhecimento e o modo como passava as informações para todos, surpreendeu todo o grupo. São poucas as pessoas que transformam seus ideais em atitudes e Adailton é assim!




Os três parques descritos acima possuem características comuns, impressas pela Serra do Espinhaço, neste trecho conhecida como Serra Geral. O relevo é predominantemente montanhoso, com chapadas, morros e picos. Por esse motivo e por representarem áreas de nascentes, é comum encontramos belas cachoeiras e cascatas em seus limites. A flora é de pequeno porte e representa área de transição entre o cerrado e caatinga, portanto encontramos tanto as famosas árvores de médio porte e galhos retorcidos típicas do primeiro bioma, como bromélias e cactáceas comuns no segundo. São freqüentes também os campos rupestres com sua vegetação predominantemente herbácea. Estes parques representam ainda importantes refúgios para animais típicos deste habitats e que se encontram ameaçados de extinção como: a onça parda, o lobo-guará, o tatu-canastra e o tamanduá bandeira, dentre outros.

Na Serra Geral, também foi visitada a Área de Proteção Ambiental do Talhado, em Serranópolis de Minas. Trata-se de uma área ainda muito bem conservada, entrecortada pelo rio Mosquito, que forma, ao longo de sua descida pela serra, belas cachoeiras, corredeiras e piscinas naturais. O “talhado” foi utilizado antigamente como rota de passagem entre as duas bordas da Serra. Reza a tradição que foi ali que a coluna Prestes aplicou a famosa estratégia do Laço Húngaro nas tropas governistas. Além disso, o local guarda lendas, crendices e é local de romarias e homenagens à Nossa Senhora, para os católicos. Apesar dos impactos gerados pela população local no primeiro trecho da trilha, a região ainda é muito conservada. Dentre as recomendações da equipe, está a criação de um parque na região.



Na trilha da APA a nossa querida jornalista Ana Medeiros quebrou o dedo do pé e foi escoltada pelo Cabo Júlio e Ricardo. Até hoje tiro onda que ela quebrou o dedo só para ser carregada e mimada. E isso foi até no final, quando fomos tomar nossa cervejinha final. Olha ela aí com Cabo Júlio e o Comandante Jarbas e sob o monitoramento do Ricardo.



As UCs estão cumprindo comalguns objetivos de conservação, no entanto percebe-se problemas como infra-estrutura própria precária, recursos humanos escassos, regularização fundiária inexistente ou incompleta e ausência de Plano de Manejo e Conselho Consultivo. Por isso, nenhum dos Parques visitados está aberto à visitação pública. Aliás, esta situação parece ser comum em Minas Gerais, já que, dos 33 parques já criados no estado, apenas 7 estão abertos à visitação.

Alguns impactos ambientais foram identificados durante a Expedição como queimadas, pichações nas inscrições rupestres, lixo, retirada de lenha e areia, carros sendo lavados nos rios dentre outros.







Quando chegamos em Montes Claros apresentamos nossa experiência e era visível como todos se tornaram amigos, companheiros e unidos. Estávamos de alma lavada! Ainda ganhei da Carolina um livro lindo Capítulos Sertanejos que descreve os lugares que passamos e a garrafa de pinga da minha primeira equipe que estava na matula.















Na volta para Aracaju, peguei o avião em Belo Horizonte e uma carona para lá com o cabo Júlio e o jornalista Juvercy. Eu que já acreditava ter vivido momentos inesquecíveis, tive uma aula sobre os problemas de segurança pública que enfrentamos no Brasil e sobre ética no jornalismo de dois personagens de caráter e responsabilidade perante a sociedade. Meninos, nunca vou esquecer nossa conversa e defendo os policiais e os jornalistas com unhas e dentes agora!

A III Expedição Caminhos das Geraes foi uma lição de vida!

Até a próxima, quem sabe!

Um comentário:

Danielle disse...

Fofinha,
Saudades...
Tudo lindo viu?
Bjo